31 de março de 2015

O EXERCÍCIO DO DESAPEGO



O amor e o apego andam ali juntinhos, de mãos dadas, um segurando bem firme no outro pra não soltar nunca. 
A ilusão do amor é o apego, a posse.
Mas se é a morte, a única certeza da vida, porque nos apegamos tanto nas pessoas que amamos e nas coisas de que gostamos? 
Porque fica impossível imaginar a vida sem as pessoas que mais amamos?
Porque quando ouvimos histórias tristes que acontecem com outras pessoas, nosso coração aperta e fica minusclinho do tamanho de um amendoim? Dói pensar ou considerar vivenciar a experiência daquela pessoa. Vem um sentimento de compaixão infinita, de dor compartilhada, de pena, de tristeza. 
E isso que sentimos, não é nem de longe um grão de areia do que a pessoa possa estar sentindo. 
Como imaginar algo deste tamanho? Como imaginar uma perda tão grande?

Não dá para imaginar.
A gente nem quer imaginar isso.
Mas porque a gente recebe da vida esses presentes de pessoas amadas que cruzam o nosso caminho?
Nós temos uma vida (nem sempre todo esse tempo) para viver este amor, sabendo que um dia iremos partir, mas a última coisa que pensamos é no fim. 
Nos preparamos para a escola, para o vestibular, para as entrevistas de trabalho, para casar, para viajar, para ter uma família, mas a única coisa que nós não nos preparamos é para esta despedida. 
Porque ela é tão impensável que simplesmente vivemos o dia de hoje, com alegria, amor, felicidade, e tentamos deslocar esse fim pra bem longe daqui. 
Quanto mais longe melhor.

Será que quanto mais a gente se conecta com a gente mesmo e com a vida, a gente vai ser capaz de exercitar o desapego com os seres que amamos? 
Admiro tanto a sabedoria oriental que encara o fim como uma passagem e o começo de um novo momento.
Acho bonito, evoluído, puro e de uma generosidade sem fim. 
Ser generoso a ponto de "deixar ir", "soltar",  é ser tocado por algo muito grande. 
Eu tenho trabalhado muito essa conexão e tentado muito exercitar o desapego. 
Mas é tão difícil.
Ainda mais tendo vivenciado uma história de perda tão cedo. Eu sei o quanto dói.
Eu sei que cicatriza. Eu sei que a gente sobrevive. Eu sei que a gente consegue voltar a ser feliz.
Eu sei que a vida é um presente. Eu sei que a experiência de viver com pessoas que a gente ama e que a gente escolheu pra se relacionar é um privilégio. 
Eu só quero que demore muito para acabar essa jornada.
Tem muito amor dentro de mim para ser compartilhado e quero compartilhar.
Quero desapegar do apego.
Será que isso é possível?